Estudo da Strategy& faz não apenas o raio X das empresas que mais investiram em P&D no mundo em 2015; um exame mais profundo revela as que investiram melhor. Seis brasileiras estão entre as mil da primeira lista
Não há evidência estatística que correlacione altos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) com melhores resultados empresariais. Porém é certo que inovar gera resultados, e dezenas de empresas estão aí para provar.
Não é apenas gastando mais em P&D, no entanto, que uma empresa se torna altamente inovadora. Mais importante do que o montante despendido é a forma como ele é usado, ou seja, como e onde os recursos são gastos. É o que mostra a 11ª edição do estudo Global Innovation 1000, realizado pela Strategy&, que traça um panorama das mil empresas de capital aberto que mais investiram em P&D no mundo.
A Apple é um exemplo de que gastar bem é mais importante do que gastar mais: a empresa norte-americana é a líder do ranking da inovação, mas aparece em 18º na lista das que mais investiram em P&D (US$ 6 bilhões em 2015). Já a Volkswagen, líder em investimentos, na ordem de US$ 15,3 bilhões, não está entre as dez mais inovadoras.
“Em comum, as primeiras empresas do ranking têm o fato de a inovação ser parte essencial de sua estratégia”, observa Eduardo Fusaro, Diretor da Strategy&. “Não necessariamente isso significa maiores gastos.”
O que quer dizer “a inovação na essência da estratégia”? Fusaro responde apontando as líderes do ranking de inovação, Apple e Google. Segundo ele, o que move essas duas empresas não é apenas o resultado financeiro; o que as diferencia das outras organizações é que o resultado financeiro depende quase integralmente da inovação.
Elas não vão colocar à venda um produto ou serviço que seja lucrativo, mas não seja inovador; os lucros terão de vir do desenvolvimento de novos produtos e serviços. Isso é ter a inovação como parte essencial da estratégia.
“O fato de o Google ter começado como um site de buscas e hoje estar liderando as pesquisas em carros autônomos é uma prova de que o que os move é a inovação”, diz o Diretor da Strategy&.
Gastar demais não garante sucesso, mas gastar pouco é igualmente desaconselhável. Pesquisar novas tecnologias, novos processos (de produção ou gestão) e criar algo que até ontem não existia exige recursos. Por isso, deve-se comemorar o crescimento de 5,1% nos investimentos em P&D em 2015 revelados pelo estudo. Trata-se do maior aumento anual desde 2012. No ano passado, as mil participantes investiram, juntas, US$ 680 bilhões para inovar.
Os gastos aumentam a despeito do cenário de incerteza na economia global. “Há uma resiliência das empresas para manter investimentos em inovação no longo prazo”, diz Fusaro. Segundo o especialista, a explicação para isso é que a organização inovadora se diferencia das concorrentes, faz a marca se fortalecer e, no final das contas, garante o bom retorno financeiro
ao acionista.
A pesquisa identificou três modelos de inovação. O primeiro se chama “need seekers”; nele, a empresa busca identificar, criar ou descobrir necessidades dos consumidores, engajando-os com novas ideias. O segundo, “market readers”, baseia-se na melhoria de produtos e serviços já existentes por meio de monitoramento de mercado. O terceiro, “technology drivers”, depende da expertise tecnológica da empresa no desenvolvimento de novos produtos ou serviços.
Sem fronteiras para a inovação
A comparação dos resultados de 2015 com o de pesquisas anteriores mostra uma mudança importante: o crescimento da Ásia como principal destino de investimentos em P&D. Em 2007, a região que mais investia em inovação era a América do Norte, com 34% do total. Os países asiáticos ficavam com 27%. Em 2015, a Ásia respondeu por 35% dos investimentos. Já os Estados Unidos caíram para 33%. A maior perda de participação foi da Europa – de 35% para 28% dos gastos mundiais com P&D (veja gráfico ao lado).
China, Índia, Coreia do Sul e Israel são os destinos preferidos das empresas que alocam recursos de P&D fora de seus países de origem. Entre 2007 e 2015, os investimentos em P&D na China aumentaram 120%, atingindo US$ 55 bilhões. A maioria das empresas disse escolher a China como destino dos investimentos por causa do tamanho do mercado, da proximidade com regiões manufatureiras e fornecedores, além de menores custos de desenvolvimento. O Brasil está fora desse radar e isso é um alerta para os CEOs brasileiros, na opinião do Diretor da Strategy&. “As empresas brasileiras devem repensar a qualificação de suas equipes para jogar esse jogo”, afirma Fusaro.
Nem toda a culpa de o Brasil ser um país de baixa inovação – se comparado com países como Estados Unidos, Japão, França e Alemanha – deve cair sobre as empresas brasileiras. De modo geral, a maioria dos participantes da pesquisa apontou o acesso a talentos como principal motivação na escolha de determinado país para investir em inovação. A proximidade com o mercado consumidor vem em seguida. “As empresas globais vão atrás dos melhores cérebros”, afirma Fusaro.
Investir em centros de inovação no exterior é uma estratégia de sucesso. A pesquisa mostrou que as empresas que fazem isso têm desempenho melhor do que as concorrentes que não investem em P&D. Segundo os dados da Strategy&, quem investiu pelo menos 60% da verba de P&D em inovação no exterior tem, em média, 30% a mais de margem operacional e 20% de lucro operacional maior do que quem foca o mercado interno.
Brasileiras que investem em inovação
Além de não se destacar na atração de investimentos em inovação, o Brasil tem participação discreta no ranking das mil empresas que mais investem nessa área. O país é representado por seis empresas: Petrobras (138º), Vale (184º), Embraer (642º), TOTVS (905º), WEG (952º) e Natura (967º). Juntas, elas investiram US$ 2,3 bilhões em P&D. Segundo Fusaro, a presença das brasileiras oscila de acordo com o desempenho da economia brasileira. Em 2014, Gerdau e Eletrobras também figuravam na lista. “Minha constatação é que há um modismo envolvendo inovação, palavra muito usada no jargão do marketing, mas pouco associada a mecanismos e processos”, afirma o Diretor da Strategy&. O ponto positivo, em sua visão, é que o valor percentual da receita das empresas brasileiras direcionado para P&D está alinhado com a média global: a TOTVS, por exemplo, investiu o equivalente a 13,6% da receita em P&D.
“A percepção que tenho é que as empresas brasileiras percebem a necessidade de inovar, mas não adotam a inovação como algo prioritário”, diz Fusaro. Não por acaso, o país ocupava, em 2015, a 70ª posição do ranking The Global Innovation Index, a lista das 141 economias mais inovadoras do mundo, compilada pela escola de administração Johnson (da Cornell University), pelo INSEAD e pela WIPO (organização mundial da propriedade intelectual, na sigla em inglês). O ranking é liderado por Suíça, Reino Unido, Suécia e Holanda. Para o Brasil melhorar sua posição, afirma Fusaro, é fundamental a aproximação das empresas com centros de pesquisa ou universidades. “Isso ocorre muito mais nos Estados Unidos, um país de altíssima inovação.” Ou seja, não se trata apenas de aumentar os gastos. É preciso que os investimentos reflitam uma estratégia cujo foco é inovar.