No ano passado, Justin estava à beira de uma decisão muito importante: onde trabalhar depois de formado? Ele recebera duas ótimas ofertas. A primeira era de um emprego no governo, na sua cidade, e que ficava a dez minutos de bicicleta de seu apartamento. Não pagavam muito, mas ele teria tempo para passar com a esposa, o sobrinho e seus pais idosos. O outro era numa empresa na maior cidade vizinha. O salário era bem melhor, mas ele teria que dispor de quatro horas por dia para o trajeto.
Todos os anos, por toda a América do Norte, milhões enfrentam decisões parecidas referentes a “perdas e ganhos” entre o tempo e o dinheiro ao planejarem os próximos passos.
Apesar da importância dessas escolhas, conhecemos, surpreendentemente, muito pouco sobre como as pessoas decidem entre ganhar dinheiro à custa de menos tempo livre e vice-versa. Então, meus colegas Lucia Macchia (doutoranda), a Professora Elizabeth Dunn e eu começamos a estudar de que maneira as prioridades dão forma às escolhas de carreira e à felicidade para depois da graduação.
O acompanhamento junto aos alunos ao longo do tempo
Perguntamos a mais de mil universitários das turmas de 2015 e de 2016 da University of British Columbia em Vancouver se normalmente priorizavam tempo ou dinheiro. Para entender como os alunos valorizavam esses recursos, apresentamos a eles descrições de pessoas – como “a Tina está disposta a sacrificar o dinheiro para ter mais tempo” e “a Maggie prefere trabalhar e ganhar mais a trabalhar menos e ter mais tempo” – e perguntamos com quem eles mais se identificavam. Pedimos também a alguns alunos que nos dissessem como quantificariam sua felicidade ao responder a perguntas do tipo: “Qual o seu nível de satisfação com sua vida no geral?”
Nós os acompanhamos por dois anos antes da graduação e pedimos que nos relatassem sobre suas satisfações, a atividade mais importante que tomava a maior parte do tempo (por exemplo, faculdade ou trabalho), e a razão pela qual estavam realizando tal atividade.
Vimos que aqueles alunos que priorizavam o tempo eram mais felizes do que aqueles que priorizavam o dinheiro. Mesmo quando consideramos o quão felizes os alunos estavam ao iniciar nosso estudo, aqueles que valorizavam o tempo eram mais felizes e estavam mais satisfeitos com a vida e com a carreira, passados um ou dois anos da graduação. Nossos resultados apresentam dados convincentes de que atribuir valor ao tempo coloca as pessoas numa trajetória de satisfação para com o trabalho e o bem-estar.
Por quê? Depois de formados, os alunos que davam valor ao tempo e não ao dinheiro tomaram decisões relacionadas à carreira por motivos diferentes. Seja escolhendo começar a trabalhar ou fazer uma pós-graduação, eles estavam mais propensos a dizer que trabalhavam em algo que “queriam fazer” em vez de algo que “tinham de fazer.”
Pessoas guiadas pelo tempo se concentram na “felicidade” do futuro emprego
Os alunos que informaram que o tempo era o recurso de maior valor estavam contentes, não por trabalharem menos, mas por se divertirem mais fora do trabalho que realizavam. Isso vai ao encontro dos nossos dados, mostrando que as pessoas que dão prioridade ao tempo não trabalham menos (algumas chegam a 50 ou 60 horas por semana), ou mesmo ganham menos; elas estão mais felizes porque tendem a buscar atividades que consideram prazerosas.
Isso é um fator importante porque, quando precisamos escolher um trabalho, muitos de nós damos muita importância à remuneração e ao prestígio, e pouca ao prazer. Em nosso estudo, os alunos que valorizavam o tempo tinham mais propensão a dar ênfase ao fator gratificação na carreira futura – eles queriam empregos que representassem algo para eles e que fossem gratificantes – o que ajuda a explicar por que afirmavam que teriam um nível maior de satisfação mais adiante.
Os estudantes que valorizavam o tempo também escolheram diferentes carreiras. Aqueles que priorizaram o tempo tendiam a fazer outra faculdade, ao passo que aqueles que priorizaram o dinheiro estavam mais propensos a trabalhar período integral ou ir atrás de graduações em administração. No entanto, em nossos dados, a razão pela qual os estudantes seguiam uma carreira após a graduação tinha mais peso para a felicidade do que àquilo que haviam escolhido fazer anteriormente.
Isso acontece por terem pais abastados ou por que gostam de coisas boas?
Pode ser que os estudantes que valorizaram mais o tempo do que o dinheiro tivessem pais ricos ou fossem menos materialistas. Para verificar, perguntamos aos estudantes se seus pais eram ricos e se eles davam valor ao fato de possuir coisas boas. Independentemente do poder aquisitivo dos pais e do quanto lhes importava ter posses, aqueles que valorizavam o tempo escolheram a carreira que os fez felizes depois de um ou dois anos.
É mais fácil priorizar o tempo livre quando a condição financeira é garantida
Os resultados obtidos não devem ser considerados evidências de que o fator financeiro não influencia as pessoas a dar mais valor ao tempo ou ao dinheiro. A sensação de segurança financeira é crucial na tomada de decisões importantes para a vida no que tange a ter mais tempo ou mais dinheiro.
A sensação de insegurança financeira é causada por muitos fatores, entre eles a desigualdade de renda. As pessoas que vivem em áreas de maior desigualdade sentem-se mais inseguras financeiramente e estão mais propensas a valorizar o dinheiro. Aquelas que cresceram em famílias que brigavam por dinheiro também tendem a se concentrar nele, e não no tempo quando adultos, mesmo que tenham muito dinheiro nos dias atuais. Esses fatores ajudam a explicar por que algumas pessoas preferem o dinheiro ao tempo, ainda que isso custe a felicidade.
Obviamente, a dívida faz o seu papel. As pessoas que possuem limitações financeiras objetivas, como universitários perto da graduação com dívidas altas – tendem a se concentrar mais em ter dinheiro em vez de tempo. Nosso estudo foi realizado no Canadá, onde estudantes se formam e estão muito menos endividados do que os estudantes nos Estados Unidos. Esses resultados não devem ser generalizados para locais onde o endividamento é maior.
Com a idade, as pessoas tendem a se sentir mais seguras financeiramente e têm mais chances de valorizar o tempo, mostrando que suas diretrizes pessoais se tornaram mais flexíveis. Em nosso estudo, pouco menos da metade dos estudantes que valorizavam o tempo mais do que dinheiro antes da graduação ainda o faziam, quando os acompanhamos no período depois da graduação; no entanto, é preciso realizar mais pesquisas para compreender como as prioridades mudam ao longo da vida.
De modo geral, é preciso realizar mais trabalhos para entender por que algumas pessoas dão ênfase ao tempo e outras ao dinheiro, e para entender as consequências que isso traz ao longo de outras mudanças, como o casamento ou o nascimento de um filho.
O quadro geral das escolhas entre tempo e dinheiro
Tentar descobrir como incentivar mais pessoas a priorizar o tempo nunca foi tão importante quanto nos tempos atuais. As pessoas jamais ficaram “sem tempo” como agora. Um levantamento realizado com 2,5 milhões de pessoas que vivem na América do Norte afirma que 80% delas disseram não ter tempo suficiente para fazer tudo o que gostariam ou precisam fazer todos os dias. Nesse levantamento, o estresse causado pela falta de tempo causou um efeito mais negativo na felicidade do que a falta de emprego.
A maneira como valorizamos o tempo e o dinheiro afeta a nossa felicidade como sociedade. De acordo com alguns dados que analisamos da World Values Survey (um levantamento padrão feito com 220 mil participantes de 80 países), nações com índices de cidadãos que davam mais valor ao prazer do que ao trabalho, obtiveram pontuações mais altas no quesito felicidade. Valorizar o tempo até protegeu cidadãos – igualmente em países de alta ou de baixa renda – das consequências psicológicas negativas causadas por choques financeiros, como a crise econômica de 2008. Sendo assim, regras que auxiliam as pessoas a se concentrarem no tempo, como quitar a dívida estudantil para reduzir o nível de insegurança financeira, são de grande interesse para os países no mundo todo.
As decisões acerca do tempo e do dinheiro são fator comum na vida de todos nós. Às vezes não conseguimos escolher as prioridades; provavelmente iremos escolher o emprego que paga melhor à custa do sacrifício do tempo para socializar com amigos e família. A sociedade precisa se esforçar para fazer com que todos nós possamos sentir que temos a possibilidade de escolha e darmos prioridade ao tempo, e não ao dinheiro. Entretanto, quando tivermos a oportunidade para escolher qual recurso priorizar, os dados são claros: valorizar o tempo tende a nos trazer felicidade plena não só naquele momento específico, como também em longo prazo.
Lembra-se do Justin? Ele acabou por escolher o trabalho que paga mais, com maior tempo de deslocamento. Dois anos depois, ele estava rico, divorciado e infeliz. Quando você tiver de fazer a escolha, leve em consideração o que você pode ganhar caso opte por mais tempo e não, dinheiro.
Ashley Whillans é professora assistente na área de Negociação, Organização e Mercado da Harvard Business School. Seu estudo se baseia em tempo, dinheiro e felicidade.
Fonte HBR