As interrupções sempre foram uma realidade no trabalho, pois reuniões, mensagens de texto ou chat, e-mails e conversas com colegas fragmentam nosso tempo e, portanto, nossa atenção. Como a pandemia da Covid-19 obrigou muitos de nós a trabalhar em casa, administrar simultaneamente responsabilidades profissionais e não profissionais se tornou mais um elemento dessa fragmentação. Em nossa recente pesquisa com 202 profissionais, conduzida antes da pandemia, 40% dos entrevistados relataram ter mais de dez interrupções por dia, sendo que 15% relataram mais de 20 interrupções por dia. Estudos sobre diversas outras pesquisas sugerem que funcionários — de profissionais de TI a prestadores de serviços de saúde — são interrompidos a cada seis a 12 minutos. Se as interrupções são tão frequentes e aparentemente inevitáveis, como afetam nosso trabalho e o que podemos fazer a respeito?
Pesquisas anteriores feitas por uma de nós (Sophie Leroy) demonstraram que nosso cérebro tem dificuldade para desviar a atenção entre tarefas. Na maioria das vezes, parte de nossa atenção permanece focada na tarefa interrompida e não muda totalmente para a outra demanda — um termo que ela cunhou como resíduo de atenção. Isso acontece porque temos uma necessidade primordial de conclusão, o que torna a troca de atenção algo muito difícil para o nosso cérebro executar. Agarramo-nos ao trabalho incompleto em vez de colocá-lo de lado, mesmo quando uma mudança de foco é necessária. Embora possamos pensar que nossa atenção foi direcionada para a próxima tarefa, isso não aconteceu, pelo menos não totalmente — um resíduo permanece. Consequentemente, executamos a segunda tarefa com apenas parte de nossos recursos cognitivos e corremos o risco de executá-la de maneira insatisfatória.
Sendo assim, sempre corremos o risco de ficarmos com resíduo de atenção quando somos interrompidos? Há condições que podem aumentar esse risco? Existe algo que possamos fazer para evitar o resíduo de atenção e, assim, minimizarmos o risco de baixo desempenho ao interromper tarefas?
Essas foram as perguntas que fizemos em nossa pesquisa, publicada recentemente na Organization Science. Utilizamos dados de pesquisa e experimentos de laboratório para entender mais a fundo alguns dos mecanismos específicos envolvidos nas interrupções que acontecem no trabalho. Muitas das pesquisas sobre interrupções se concentraram principalmente na tarefa que é interrompida, o que é importante, mas conta apenas uma parte da história. Aqui, escolhemos nos concentrar em como a tarefa que causou a interrupção é afetada por fatores contextuais. Também fornecemos uma solução prática, um “Plano de Retomada”, que pode aliviar os efeitos negativos das interrupções e, principalmente, ajudar a prevenir o resíduo de atenção.
De modo específico, nossa pesquisa mostra que ser interrompido é especialmente difícil quando sabemos que sofreremos pressão devido ao pouco tempo que teremos para concluir o trabalho interrompido quando o retomarmos. Em nosso estudo, os participantes começaram a trabalhar em uma primeira tarefa — vamos chamá-la de Tarefa A. Após cinco minutos, nós os interrompemos sem avisar e pedimos que parassem o trabalho incompleto a fim de iniciar outra tarefa, a Tarefa B — a tarefa que causou a interrupção.
Dividimos os participantes em dois grupos (ou condições experimentais). Um grupo foi informado de que teria tempo suficiente para concluir a tarefa posteriormente, enquanto o outro foi informado de que não teria muito tempo. Os participantes que acreditaram que enfrentariam pressão por possuírem pouco tempo ao retomarem a Tarefa A demonstraram níveis elevados de resíduo de atenção e redução significativa no desempenho da Tarefa B, a tarefa que causou a interrupção: as pessoas não processaram as informações com cautela, não perceberam erros e quando solicitadas a tomar uma decisão baseada em informações a serem relembradas, tenderam menos a identificar a solução ideal. Por outro lado, quando os participantes sabiam que teriam muito tempo para completar a tarefa interrompida, sair dela foi menos difícil, de modo que não tiveram resíduo de atenção e apresentaram níveis mais altos de desempenho na demanda que causou a interrupção.
Embora nossos resultados indiquem que a redução da pressão quanto ao tempo pode diminuir o estado de resíduo de atenção, devemos ser cautelosos, pois as organizações atuais se baseiam no cumprimento de prazos e exercem muita pressão nesse aspecto. Estamos condenados a um constante estado de resíduo de atenção ou existe uma saída?
Propomos o “Plano de Retomada” como forma de administrar as interrupções, evitar o resíduo de atenção e atuar com capacidade total na tarefa que causou a interrupção. A premissa do plano é que, se pudermos deixar nosso cérebro tranquilo em relação à nossa capacidade para concluir a tarefa interrompida ao retomá-la, seremos capazes de desviar nossa atenção com mais eficácia.
Para testar essa ideia, realizamos uma série de experimentos de laboratório. Novamente, os participantes começaram a trabalhar na Tarefa A e foram interrompidos para iniciar outra tarefa, a Tarefa B. Em um grupo, os participantes imediatamente passaram a realizar a tarefa que causou a interrupção, a Tarefa B. No outro grupo, pedimos aos participantes que reservassem alguns minutos antes de iniciarem a outra tarefa, para a criação de um “Plano de Retomada”. Basicamente, dedicar alguns minutos para observar em que ponto estavam na tarefa interrompida – a Tarefa A – e o que queriam fazer e no que focar na retomada do trabalho. Em seguida, mudaram para a Tarefa B.
Descobrimos que, aqueles que fizeram um “Plano de Retomada” tiveram muito menos resíduo de atenção na tarefa que causou a interrupção e apresentaram desempenho significativamente melhor. Eles conseguiram se lembrar com mais eficácia das informações da segunda tarefa, sugerindo uma atenção mais cuidadosa. As pessoas também foram 79% mais propensas a escolher um candidato ideal quando a Tarefa B solicitava que avaliassem perfis para um cargo, revelando uma melhor tomada de decisão envolvendo informações complexas.
O “Plano de Retomada” exigiu menos de um minuto dos participantes e ainda proporcionou benefícios significativos. Essa prática simples e rápida de prestar atenção no ponto que você estava na tarefa interrompida e planejar uma retomada ajuda o cérebro a se sentir mais à vontade para colocar a tarefa de lado e desviar a atenção para outra demanda.
Nosso trabalho mostra que não temos de sucumbir passivamente aos efeitos negativos das interrupções inevitáveis. O “Plano de Retomada” proporciona ao cérebro o encerramento cognitivo de que precisa para reduzir o resíduo de atenção e para que possamos estar mais presentes e atuarmos no máximo de nossa capacidade.
Alguns podem argumentar que a implementação de um “Plano de Retomada” pode ser difícil quando a interrupção é feita por um superior ou um cliente importante, por exemplo. No entanto, faz parte do processo; pedir permissão para fazer anotações sobre a tarefa interrompida e agradecer às pessoas por nos permitirem estarmos totalmente presentes e atentos são atitudes, geralmente, apreciadas. E lembre-se de que, ao interromper outras pessoas, você também pode incentivá-las a fazer um “Plano de Retomada” para que possam lhe dar toda a atenção. Como um benefício adicional, mediante tais interações, colegas de trabalho que normalmente interrompem passam a refletir sobre a real urgência de determinada questão antes de interromper e, por fim, cria-se um limite para interrupções. Sim, interrupções no trabalho podem ser um aspecto da vida organizacional, mas com o “Plano de Retomada” podemos mitigar seus efeitos.
Sophie Leroy é Professora Adjunta da Faculdade de Administração da University of Washington Bothell. Sua pesquisa explora como as pessoas gerenciam e alocam tempo e atenção no trabalho e os efeitos das interrupções no desempenho. Leroy desenvolveu o conceito de Resíduo de Atenção e estuda como ajudar as pessoas a terem mais atenção no trabalho e a estarem mais presentes na vida.
A Dra. Theresa M. Glomb é titular da cátedra Toro Company–David M. Lilly na Carlson School of Management, University of Minnesota. Sua pesquisa é direcionada ao bem-estar dos trabalhadores e ao papel das microintervenções, ou truques de produtividade, pequenas práticas destinadas a promover maior reflexão, atenção plena e intencionalidade no trabalho.
Fonte HBR