Durante nossa primeira conversa, Henry, CEO de uma empresa de tecnologia, expressou sua frustração em relação à inabilidade de sua empresa em se manter focada e implementar suas prioridades. “No início de cada trimestre chegamos a um consenso quanto às nossas prioridades,” disse ele, “mas na hora de revisitá-las, sou informado que crises urgentes nos impediram de fazer qualquer progresso. Nunca conseguimos fazer nada’’.
Quando perguntei ao Henry que soluções ele havia tentado para recolocar a equipe no foco, ele mencionou uma ladainha de atividades relacionadas às principais iniciativas: check-ins semanais, protocolos que limitam o excesso de e-mails, painéis online mostrando o progresso — ou a ausência deste. Essas soluções mostravam que Henry definia seu problema como simplesmente uma “prestação de contas’’ (reuniões frequentes de andamento das atividades e painéis públicos) e “capacidade” (tentativa de diminuir a quantidade de e-mails).
Porém, meu diagnóstico mostrava outra coisa.
Depois de passar algum tempo na empresa, percebi que os problemas do Henry eram gerados por um sistema deficiente de governança. As “crises urgentes” que impediam sua equipe de fazer qualquer progresso advinham da falta de coordenação efetiva entre as duas partes principais de sua empresa. O resultado: a inexistência de um fórum no qual líderes pudessem solucionar, de forma produtiva, as complicadas contrapartidas.
Henry tinha diagnosticado o problema incorretamente. Contudo, ele não é o primeiro líder competente a cometer este erro. Após 35 anos trabalhando com consultoria, aprendi que é muito comum que isso aconteça, em grande parte, porque os desafios recorrentes de desempenho acabam sendo maiores do que inicialmente parecem ser. Com frequência, são sintomas de um problema maior, enraizado na estrutura da empresa. Entretanto, quando os líderes diagnosticam erroneamente os sintomas, perdem muito tempo tentando encontrar soluções superficiais, que acabam não dando certo.
Quatro dos incômodos mais comuns que vi surgir em consequência de estruturas organizacionais ineficientes são: prioridades concorrentes, rotatividade indesejada, chefes inacessíveis e, rivalidade interfuncional. Se você se deparar com um ou mais desses problemas, considere se os desafios estruturais sobre os quais falarei a seguir não são sua maior causa. Fazer isso pode ajudá-lo a identificar e resolver o verdadeiro problema.
Sintoma: prioridades concorrentes
Desafio comum de estrutura: governança deficiente
A empresa de Harry foi estruturada com organização matricial, o que significa que a maior parte das pessoas têm dois chefes. Neste caso, eram organizados por funções, como marketing, vendas e, engenharia. Eram também organizados em três segmentos: usuários de plataformas empresariais, pequenos negócios e, usuários individuais de software. Cada equipe era liderada pelo chefe da função, como também pelo vice-presidente da divisão, responsável por aquele segmento de clientes.
O problema era que os vice-presidentes reportavam ao COO e os líderes de função reportavam ao Henry. Quando a equipe do Henry se reuniu para estabelecer as prioridades de cada função, os vice-presidentes da divisão não estavam presentes para avaliar como suas prioridades se encaixavam no “grande planejamento” da empresa.
Resumindo, a empresa de Henry não fora estruturada para ser administrada matricialmente. Sua empresa estava estruturada para gerenciar uma organização funcional de estrutura vertical. Em estruturas organizacionais complexas, como, por exemplo, a matricial, o sistema de tomada de decisões deve ser estabelecido para gerir os conflitos usuais, decorrentes de prioridades e recursos. Caso contrário, os conflitos não resolvidos se tornam disfuncionais, como foi o caso do Harry. Até que ele abordasse este problema mais profundo, nenhuma solução simples resolveria o problema das prioridades concorrentes. A partir do momento em que entendeu isso, trouxe os vice-presidentes do “segmento consumidor” para o seu time, e começou a capacitar os três times do segmento de consumidores para gerenciarem os tradeoffs operacionais ao permitir que decidissem as prioridades de curto prazo para ambos os segmentos e funções.
Sintoma: Rotatividade indesejada
Desafio comum de estrutura: estrutura de funções deficientes
Os líderes geralmente rotulam as deserções indesejadas de “problemas de retenção” e mandam o RH incentivar as pessoas a ficarem. Opções em ações e bônus são concedidos, ou novos títulos criados para dar a aparência de promoção. Isso pode funcionar temporariamente se as deserções são motivadas por departamentos atolados de trabalho ou gestores tóxicos. Porém, se elas ocorrem por toda a empresa, é provável que a culpada seja a estrutura da empresa.
Uma empresa para a qual trabalhei lutou contra o aumento de rotatividade, decorrente de vários anos de reorganizações desastradas. Os executivos reputaram esse fato às frustrações do pessoal, devido às tantas mudanças malsucedidas. Contudo, este não era o problema. A verdadeira razão era que, na tentativa de reduzir custos, a liderança consolidou alguns trabalhos específicos por ocasião de certas reorganizações — como por exemplo, finanças, contabilidade e compras — em funções muito amplas, com um enorme leque de responsabilidades. Outras reorganizações foram usadas para encolher tanto determinados setores, que muitos funcionários precisaram trabalhar em estreita colaboração com outros para conseguirem fazer seu trabalho. Esta estrutura de “funções deficientes’’ fez com que várias pessoas tivessem de desempenhar muito além de sua competência, enquanto outras estavam presas a tarefas banais que demandavam coordenação em demasia. Para muitos, sair da empresa foi a melhor opção.
A empresa precisava entender que funções corretas são estruturadas acerca do resultado desejado, e não das pessoas que as ocupam. Quando as empresas estabelecem as funções em torno das pessoas, elas definem involuntariamente o seu valor pela soma total do que a pessoa naquela função é capaz de fazer. Como resultado disso, uma função só parece ter importância quando um “astro” a ocupa — independentemente do quanto seja vital para o desempenho da empresa. Da mesma forma, uma função é considerada irrelevante quando é ocupada por alguém de fraco desempenho.
O problema é que nem todas as funções são igualmente importantes numa empresa. Uma estrutura eficiente define o valor de uma função pelo seu impacto no desempenho competitivo. A empresa para quem dei consultoria aprendeu que uma função deve ser definida pelas competências que a pessoa que venha a ocupá-la precisa ter para entregar o conjunto de métricas definido pela empresa como um todo. Só então, a pessoa qualificada deve ser contratada para ocupá-la.
Sintoma: chefes inacessíveis
Desafio comum de estrutura: abrangência excessiva de controle
Muitas vezes, quando pesquisas conduzidas com funcionários resultam em índices baixos para métricas como “meu gestor está disponível quando preciso dele’’, as pessoas assumem que isto acontece em decorrência de problemas de gestão de tempo, ou porque os líderes não se esforçam para se reunir com seus subordinados diretos. Quando isto acontece, os gestores recebem ferramentas prontas para aprenderem a conduzir reuniões individuais mais eficientes, ou para priorizarem melhor suas tarefas. Treinamentos em empatia podem também se somar ao currículo de liderança. Coaches podem ser contratados. No entanto, a verdade é que os problemas tendem a ir muito além de práticas individuais de liderança.
Este era o caso da empresa para quem trabalhei. Seus funcionários reclamavam que nunca recebiam feedback ou direcionamento suficientes de seus líderes. Os líderes, por sua vez, reclamavam que precisam trabalhar com muitos níveis hierárquicos acima deles para que suas decisões fossem aprovadas ou mesmo, garantir verbas, e que tinham muitos funcionários diretos abaixo deles para dedicar tempo suficiente a cada um. Em média, um gestor pleno tinha entre 12 e 18 funcionários diretos. A empresa, como muitas outras, tratava a abrangência de poder como medalhas de honra para inflar o ego dos líderes — quantos mais funcionários tivessem, eles filosofavam, mais importantes se sentiriam.
Contudo, para que as equipes funcionassem com eficiência, o número de camadas hierárquicas e o número de subordinados diretos de um líder de equipe deveriam ser definidos com cuidado, baseados em dois fatores: o tipo de trabalho a ser feito e quanta coordenação este trabalho requer. Trabalhos de alta complexidade ou de alto risco — como, por exemplo, cientistas conduzindo testes clínicos de um novo medicamento, ou analistas interpretando dados confidenciais — geralmente demandam muita coordenação para serem executados de forma eficaz. Portanto, de forma a assegurar o desempenho de alta qualidade, faz sentido manter um alcance menor para o gestor. O trabalho comum e mais repetitivo — como, por exemplo, de engenheiros escrevendo códigos técnicos ou equipes em linhas de produção — normalmente permitem que os funcionários sejam mais autônomos, o que permite que seus gestores possam ter responsabilidades de maior alcance. No entanto, quando essas nuances são ignoradas, o nível de “alcance do gestor” pode ficar seriamente limitado. Entretanto, como foi o caso da empresa acima, não é realista esperar que um líder possa atender 12 ou mais funcionários diretos de forma eficiente — independentemente do tipo de trabalho que essas pessoas façam.
Sintoma: rivalidade interfuncional
Desafio comum de estrutura: incentivos ou métricas desalinhados
Quando as pessoas têm dificuldade em trabalhar com todos os departamentos, rótulos como “não cooperativo”, “burocrático”, ou “político’’, costumam ser lançados na empresa para explicar por que departamentos como vendas e marketing não se dão bem, ou por que operações e P&D estão em desacordo. Sessões para consolidar as equipes e fortalecer a confiança são implementadas, ou funcionários trocam de função para desempenharem como articuladores e promoverem coesão. Porém, frequentemente, por trás dos conflitos departamentais encontram-se métricas e/ou incentivos desalinhados, que na verdade, encorajam a rivalidade.
Métricas e incentivos são vitais para o alinhamento entre as equipes. Eles moldam o comportamento das pessoas ao definir o que é importante para a empresa, sincronizam tarefas, e asseguram que todos estejam trabalhando por um objetivo comum. Métricas e incentivos desalinhados, pelo contrário, podem agir como engrenagens, puxando as pessoas em direções opostas e empurrando-as para objetivos conflitantes.
Em uma das empresas para a qual dei consultoria, duas divisões do marketing passaram por isso. Uma delas foi incentivada a gerar tráfego online para o site da empresa, enquanto a outra foi estimulada a converter este tráfego em vendas. Isso levou a mensagens contraditórias nas landing pages, uma divisão culpando a outra, metas não cumpridas, e aversão em compartilhar o web analytics, apesar de dependerem muito entre si, para alcançar o sucesso.
Quando duas funções se encontram em um ponto crítico para produzir resultados conjuntos, precisam ser capazes de examinar de perto seus incentivos e métricas para assegurar que irão reforçar – e não desencorajar – a colaboração tão necessária. As duas divisões passaram um dia juntas trabalhando em um plano para assegurar que o tráfego e a conversão não fossem mutuamente excludentes, e criaram acesso conjunto para o web analytics, para que pudessem colaborar uma com a outra antes de montarem o planejamento para gerar tráfego e conversão.
Problemas crônicos têm raízes mais profundas do que as que enxergamos, e isso não acontece por acaso. Costumo dizer aos meus clientes: “Sua empresa está perfeitamente estruturada para chegar aos resultados que você está alcançando, mesmo que não sejam aqueles de que gostaria.” Da próxima vez que um incômodo organizacional persistente não desaparecer, apesar de todos os seus esforços, pergunte a si mesmo: “Este é um sintoma de qual problema estrutural mais profundo?’’ Se você der um passo atrás e observar por algum tempo os fatores que perpetuam seu problema, encontrará uma solução que funcione.
Ron Carucci é cofundador e sócio-gerente da Navalent, onde trabalha com CEOs e executivos que buscam alcançar mudanças transformacionais para suas empresas, lideranças e setores onde atuam. Ele é autor de oito best-sellers, incluindo o livro mais vendido na Amazon, recentemente, Rising to power.
Fonte HBR