Para milhões de norte-americanos, a nova lei de assistência social não será suficiente e chegará tarde demais. O prazo esperado para que os pagamentos em dinheiro cheguem aos trabalhadores demitidos e aos pequenos negócios é de três semanas. As empresas podem adiar pagamentos e cortar custos, mas os funcionários que perderam sua renda sem aviso prévio não podem esperar três semanas para se alimentar, ou alimentar sua família. Para a maior parte dos Estados Unidos da América, esta é uma crise que exige medidas imediatas que só empresas podem tomar.
A maneira como as grandes corporações reagem a esta crise fará com que este momento seja decisivo e lembrado por décadas. Trinta e oito anos atrás, sete pessoas em Chicago morreram ao tomar comprimidos de Tylenol envenenados. Foi um evento único e localizado, mas a Jonhson & Jonhson imediatamente retirou todo o estoque de Tylenol do varejo em todo o país, e sofreu um enorme prejuízo para evitar que qualquer outra morte ocorresse. As pessoas até hoje comentam essa decisão. Até os que não eram nascidos naquela época estudam este case em cursos de administração.
LEITURA ADICIONAL
Diversas grandes corporações dizem ter um propósito social e valores, ou o quanto se preocupam com seus funcionários e outros stakeholders. Agora é a hora de cumprirem este compromisso. Pesquisas sugerem que as pessoas só acreditam que sua empresa realmente tem propósitos e valores claros quando veem que os gestores tomam decisões que sacrificam a rentabilidade de curto prazo em prol da adesão a esses valores
Quando a CVS, uma rede de farmácias americana, resolveu mergulhar fundo no segmento de cuidados com a saúde, decidiu que não poderia mais vender produtos de tabaco em suas lojas, e abriu mão de US$ 2 bilhões de receita. Quando minha empresa de consultoria em impacto social, a FSG, se deparou com a recessão de 2008, tomamos a decisão de não demitir pessoas e, em vez disso, reduzimos os salários em uma escala proporcional; os que ganhavam mais sofreram a maior redução salarial e aqueles que ganhavam menos, sofreram um impacto menor. Passou-se mais de uma década, as pessoas ainda falam sobre isso — e agora, resolvemos repetir a dose.
Até entendo que líderes empresariais enfrentam pressão por parte dos investidores e banqueiros para manter o caixa e reduzir custos, mas nem os investidores, nem os banqueiros morrerão de fome. Mesmo os aposentados, que viram suas economias desaparecerem, poderão ver suas ações se recuperarem, desde que não entrem em pânico e as vendam. As empresas amortizam custos com reestruturações, erros em produtos e mesmo aquisições que dão errado o tempo todo. Todos conseguirão entender a amortização das perdas decorrentes da pandemia do coronavírus. A seguir, algumas coisas que organizações podem fazer para ajudar seus funcionários, pequenos fornecedores, prestadores de serviço na área da saúde e comunidades.
Funcionários. O que as empresas fizerem para ajudar seus funcionários demitidos — além daquilo que é exigido ou esperado — será lembrado e recompensado com aumento de lealdade, maior produtividade e com o benefício de uma boa reputação por muitos anos.
Continuar pagando salários, mesmo que não integralmente, é uma opção. O Walmart, a Microsoft, a Apple, e o Lyft comprometeram-se a continuar pagando os funcionários horistas pelo menos nas duas primeiras semanas de lockdown. Isso é fundamental não só por ser uma responsabilidade corporativa, mas porque reduzirá substancialmente o custo de recontratação de pessoal quando a economia voltar ao normal.
Emprestar dinheiro aos funcionários é uma outra possibilidade. Se ficarem por conta própria, muito funcionários recorrerão às exorbitantes taxas de juros do crédito rotativo do cartão e payday lenders (empresas de empréstimos de curto prazo) que cobrarão 20% ou mais de juros, enquanto as corporações podem conseguir empréstimos pagando apenas 2% ou 3%. Essa diferença nas taxas de juros pode ser a diferença entre a falência e a sobrevivência econômica. As empresas deveriam usar seu crédito corporativo e suas garantias para conseguir empréstimos de baixo ou nenhum custo para o seu pessoal. Devem calcular o salário líquido dos funcionários depois de todas as deduções em folha serem feitas, e pedir aos seus bancos que disponibilizem empréstimos equivalentes a um mês de salário líquido com taxa de 3% de juros, garantidos pela empresa. Os funcionários poderão pagar os empréstimos ao longo do próximo ano, quando retornarem ao trabalho.
Muito provavelmente, muitos poucos funcionários da empresa necessitarão de cuidados médicos, mas no caso de não possuírem nenhum tipo de assistência, poderão ir à falência. As empresas deveriam se oferecer para pagar as despesas médicas de todo o seu pessoal não assistido — provavelmente uma parcela entre 2% e 5% terá despesas médicas significativas — e poderiam negociar com seus fornecedores de assistência médica um prêmio adicional para cobrir os funcionários. Infelizmente, os funcionários também precisarão de ajuda para cobrir o custo de funerais, no caso dos poucos que vierem a óbito.
Pequenos fornecedores. As empresas deveriam se oferecer para antecipar os pagamentos aos pequenos fornecedores, dando-lhes dinheiro hoje para comprar as mercadorias que serão necessárias quando voltarem a produzir. É o equivalente corporativo da compra de cartões-presente para garantir que sua loja do bairro continue operando.
Fornecedores de serviços de saúde. Algumas regiões do mundo estão enfrentando uma extrema falta de suprimentos médicos e hospitalares básicos, mas sendo uma corporação global, você tem acesso a recursos em todo lugar. A necessidade de máscaras na China e Coréia do Sul decresceu, mas continua aumentando nos Estados Unidos e na Europa. As empresas deveriam comprar e enviar suprimentos de onde estão disponíveis, para onde são necessários. Devem fazer o inventário de tudo aquilo que têm e que pode ser útil, enviar para onde for mais urgente e arcar com a perda.
Comunidades. As grandes corporações devem usar suas fundações para ajudar cozinhas comunitárias, clínicas gratuitas e outras organizações sem fins lucrativos para atender às necessidades imediatas das comunidades onde operam.
Ninguém espera ou exige que grandes empresas tomem medidas extraordinárias para ajudar seus vários stakeholders, mas as atitudes corajosas e criativas que tomarem hoje para prontamente prestarem assistência definirão o seu legado no futuro.
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Mark R. Kramer é palestrante sênior na Harvard Business School e cofundador e diretor superintendente da FSG, uma empresa de consultoria em impacto social.
Fonte HBR