Amyr Klink começou sua carreira como explorador atravessando o Atlântico Sul sozinho em um barco a remo construído por ele próprio, aventura que lhe rendeu o livro Cem dias entre o céu e o mar. Depois, estreia como velejador em seu barco, Paratii, em uma viagem solitária de 642 dias para a Antártica, onde passou sete meses e meio em uma invernagem antártica. Hoje, ele tem mais de 30 embarcações e mais de 200 milhas percorridas em alto mar. Além de seus livros, Amyr já deu quase 300 palestras relatando suas façanhas e inspirando pessoas sendo exemplo de autodisciplina e liderança. Entrevistado por Julio Viana
O que atraiu você desde o começo e ainda atrai nesse ambiente de viagens navais e expedições para a Antártica?
Amyr Klink: Não é a viagem.
É o desafio do processo todo.
É claro, eu corto os dedos para estar mais uma temporada lá. Não importa qual o meio, gosto de estar lá. Mas a experiência da viagem com uma solução que você desenvolveu, projetou, construiu, que você mesmo opera, é muito gratificante.
Você é um economista que aos 29 anos abandonou a carreira para velejar. Em algum momento durante sua carreira de explorador, sua formação de economista o ajudou?
Ajudou porque eu sempre gostei de ter independência. Primeiro precisei conquistar independência em relação a minha família. Só consegui após resolver os passivos do meu pai [através da minha profissão]. Depois, a experiência que mais me envolveu no processo pelo qual eu tinha me preparado na escola foi a travessia pelo Atlântico Sul. Quando eu decidi “eu vou fazer um barco”, percebi que deveria me organizar para isso, que não era uma empreitada simples. Tinha a parte técnica, física, mas também tinha a parte burocrática, contratar fornecedores etc.
Seus barcos são conhecidos pelas inovações tecnológicas criativas e baratas. Mesmo assim, você não tem formação como engenheiro. Como fez para aprender? Foi na base da leitura apenas?
Foi na base prática. Eu tinha muita curiosidade por problemas técnicos e, por isso, sempre gostei de entender.
Eu comecei a observar o estilo das embarcações brasileiras, algo pouco conhecido. Temos uma riqueza de soluções aqui que ainda são vivas, de barcos regionais como no Paraná, Nordeste e Amazônia.
Em 2003, você refez a circum-navegação polar com mais quatro pessoas na tripulação. Como foi essa experiência de ser um líder em situações extremas?
Foi uma espécie de aprendizado comandar um grupo de pessoas e perceber que, às vezes, elas não são necessariamente aptas para o que estão fazendo até você descobrir onde cada um pode contribuir. Administrar um barco é diferente de administrar uma empresa. Na gestão de uma empresa você pode mandar o diretor financeiro incompetente embora e contratar um novo. No barco, você só pode mudar aquela tripulação se jogá-la ao mar. Você não a muda. E aí percebi uma coisa, que comento bastante hoje: não existe ser humano que não possa contribuir com o grupo, desde que consigamos descobrir alguma habilidade que ele possua, lá no fundo.
Você se considera um bom líder?
Eu sou muito rigoroso. Tem coisas e procedimentos que eu não permito dentro do barco. Acredito ter a habilidade de motivar as pessoas a colaborar. Eu me antecipo. Não mando fazer. Vou lá e faço primeiro, mostro como fazer. Gosto de
dar o exemplo.
Matéria de Julio Viana, HBRBR