A maioria de nós já precisou enfrentar pequenos retrocessos no trabalho. Mas como se recuperar de um baque tão grande a ponto de fazer você perder o emprego ou ver sua carreira ir por água abaixo?
Um perfil atualizado no LinkedIn e uma rede de contatos profissionais são apenas parte do caminho. As mudanças que você precisa fazer e as realidades que precisa aceitar são muito mais significativas.
Sei disso porque já passei por essa situação. O início da minha carreira foi extremamente gratificante. Com muito trabalho e um pouco de sorte, tornei-me a primeira mulher no estado de Massachusetts a ocupar o cargo de chefe de gabinete de dois governadores consecutivos, e a primeira mulher a assumir o controle da Superintendência de Portos de Massachusetts, responsável pela operação do Aeroporto de Logan em Boston, do Porto de Boston e de outras infraestruturas de transporte importantes. Pensei que passaria o resto da minha vida profissional atuando em cargos públicos efetivos e inovadores, talvez me tornando responsável pela gestão de uma agência federal, trabalhando na Casa Branca ou até mesmo concorrendo a algum cargo político.
E, então, o inimaginável aconteceu sob a minha supervisão.
O Aeroporto de Logan se tornou o ponto de origem dos dois aviões sequestrados que destruíram o World Trade Center em 11 de setembro. Os terríveis ataques terroristas ceifaram inúmeras vidas e devastaram milhares de famílias. A minha experiência não se compara a isso, mas a minha vida e carreira também foram extremamente abaladas. Fui considerada culpada, pela mídia e por líderes políticos, por supostas falhas na segurança do Logan. Fui obrigada a pedir demissão e, posteriormente, a família de uma vítima dos ataques de 11 de setembro me processou judicialmente por homicídio culposo.
Apesar de a Comissão responsável pela investigação dos ataques ter concluído que a segurança do Logan não era diferente da observada em nenhum outro aeroporto e dos tribunais federais terem indeferido processos em aberto contra o aeroporto, o estrago estava feito. A “Virginia Buckingham” que eu vinha desenvolvendo desde os meus 17 anos quando me mudei para Boston para frequentar a faculdade — uma mulher batalhadora, inteligente e bem-sucedida — não existia mais.
Dois anos depois, iniciei em uma área totalmente diferente. Fui trabalhar na seção editorial de um importante jornal de circulação diária, distribuído principalmente em meios de transporte público. Um mentor chegou a me dizer que eu tinha dado a “volta por cima” e, após ter atuado bem nisso por alguns anos, mudei, então, para o setor privado, onde apliquei minhas habilidades estratégicas e de comunicação em questões públicas corporativas. Atualmente, estou entre algumas das poucas executivas-seniores mais importantes na de uma empresa da Fortune 500. Contudo, me dei conta que “dar a volta por cima” não é o termo mais apropriado. Nunca conseguiria voltar ao mesmo ramo. Entretanto, eu realmente encontrei uma nova área que fosse gratificante para mim. Caso esteja enfrentando um problema que pareça impossível, lembre-se de que é possível, desde que você tenha em mente alguns conceitos simples:
1. Permita-se tempo
Eu só comecei a procurar um novo emprego mais de um ano depois. Caso tenha essa possibilidade em termos financeiros, é essencial dedicar um tempo para aliviar a pressão, pensar de forma clara e reorganizar as coisas. Não subestime a sua condição após um tombo profissional. Permita-se tempo para se recuperar, ganhar perspectiva e, simplesmente, descansar. É preciso se distanciar da crise para avaliar, longe do calor do momento, se é possível retornar à mesma função ou segmento ou se seria melhor buscar uma mudança completa. Mesmo se tiver feito essa escolha, não aceite a primeira coisa que aparecer. Contratempos são uma oportunidade para alterar o seu caminho após bastante reflexão.
2. Arrisque-se
Recentemente li uma matéria sobre um executivo financeiro que voltou a focar em uma antiga paixão, marcenaria. Ele mudou de área por escolha própria, mas mesmo que você não tenha feito essa escolha, vale a pena considerar as suas paixões. Qual é o dom que você tinha quando era mais jovem e deixou de ir atrás por inúmeras razões? Agora pode ser o momento de se arriscar. Para mim, isso aconteceu com a escrita, atividade pela qual sempre fui apaixonada. Quando minha carreira no governo terminou, fiz uma lista de todos os meus contatos na mídia e de empresas que conhecia e comecei a procurar algo. Algum tempo depois, fui chamada para trabalhar no Boston Herald. Meu salário não chegava nem perto da quantia que eu recebia anteriormente, mas eu estava sendo paga para ler e usar as palavras, e isso era a realização de um sonho. Posteriormente, fiz uma outra mudança e entrei no mundo corporativo, em um cargo que exigia as mesmas habilidades, em uma área de que gosto muito.
3. Mude a sua definição de resiliência
Se eu tivesse ganhado um centavo toda vez que alguém me dizia “siga em frente” depois do que aconteceu no Logan, eu estaria escrevendo esse artigo de uma confortável espreguiçadeira no Caribe. A ideia de “o que não mata, fortalece” é, na verdade, incoerente com a experiência que a maioria das pessoas tem quando enfrentam problemas e perdas, seja na vida profissional ou pessoal. Há uma grande diferença entre seguir em frente e avançar. O primeiro significa que você virou as costas para o sofrimento e a frustração e, portanto, para as lições que deveria aprender com o problema. Isso é inviável e indesejável. Avançar significa levar a experiência com você; a dor e a perda andam lado a lado com a sua esperança para o futuro. Em meu livro, dou uma definição diferente de resiliência utilizando a metáfora do vidro marinho — criado a partir de algo quebrado, mas ainda valioso.
4. Transmita o que aprendeu
Você não solicitou um retrocesso na carreira, mas certamente aprendeu com ele. A sabedoria e as novas perspectivas geradas com a sua experiência são uma dádiva que você deve compartilhar com outras pessoas. É por isso que conto a minha história. O poder das experiências traumáticas, intensas e não planejadas na carreira — que Warren Bennis chama de provas severas — é capaz de transformar o líder que você é. Oferecer-se para escutar, dar apoio e sugestões quando os seus colegas estão enfrentando suas próprias turbulências define o tipo de liderança que você aprendeu — e conquistou.
Virginia Buckingham é autora do livro “On my watch” (Cavan Bridge Press, 2020) e vice-presidente de assuntos corporativos da Pfizer. Buckingham já atuou como chefe de gabinete de dois governadores do estado de Massachusetts e esteve à frente da Superintendência de Portos do estado. Ela também foi editora de textos editoriais e colunista do Boston Herald.
Fonte HBR