Ninguém quer ser um robô o dia inteiro no trabalho. As pessoas desejam se sentir inspiradas, encontrar um significado e ver o impacto do seu trabalho na vida de outras pessoas. E, quando conseguem isso, sentem-se mais engajadas, inovadoras e produtivas. Isso não é um segredo ou uma revelação. É o senso comum.
Se você é um líder, ajudar outros a ter a sensação de propósito pode se tornar uma ferramenta poderosa. Então, por que tantos líderes têm problemas em iluminar seus funcionários?
A resposta é simples: é extremamente difícil incutir propósito nos outros. É necessário mais do que palestras motivacionais, discursos grandiosos ou frases refletindo uma missão para difundir um propósito. Na verdade, se forem exagerados ou pouco sinceros, esses métodos podem sair pela culatra, provocando reações de cinismo.
Propósito é uma palavra grandiosa, mas, no final das contas, trata-se de ajudar as pessoas a ver seu impacto nos outros e de desenvolver uma história que envolva a razão por que elas amam o que fazem. Se você se lembrar disso e adotar uma abordagem pessoal, autêntica e duradoura, é provável que obtenha sucesso.
Faça tudo de modo pessoal
Primeiramente, o propósito precisa ser pessoal e como o propósito deve provocar uma reação emocional, este precisa ser sentido. Não se pode apenas falar sobre o propósito.
Imagine que você é o chefe de um movimento para levantar fundos para uma faculdade a fim de ajudar a financiar bolsas de estudos para jovens carentes. Como você motivaria seus voluntários? De acordo com um estudo conduzido por Adam Grant, se você ficasse na frente do grupo e falasse sobre o impacto do trabalho deles, provavelmente não iria melhorar o desempenho de ninguém. No entanto, se você convidasse um bolsista para compartilhar sua história pessoal, isso teria muito mais impacto. De fato, no estudo de Grant, depois que os voluntários ouviram a história do bolsista, eles angariaram quase 400% mais dinheiro que a média.
Quando eu contei a alguns líderes da F. Hoffmann-La Roche AG, uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo, sobre o estudo de captação de recursos, um deles se animou e exclamou: “isso aconteceu conosco!”
Ela explicou como sua equipe trabalhava no departamento de dispositivos médicos. Seu grupo era por vezes menosprezado pelas pessoas na organização que acreditavam que a química era “mais interessante” do que a engenharia. Muitas pessoas do departamento não estavam completamente engajadas e a moral da equipe estava bem baixa. Um dia a líder conseguiu que uma cliente contasse para a equipe sua história pessoal.
Esta cliente tinha diabetes e tinha de verificar seu sangue diariamente para garantir que sua dose de insulina estava correta. Infelizmente, essa mulher não entendeu a quantidade de sangue necessária e picava o dedo mais do que o necessário para obter o sangue. Não só doía todos os dias, como tornou-se algo que ela temia, mas também causava um grande dano aos seus dedos. Ela picava um dedo da ponta até a articulação, inflamava tudo e às vezes infectava, antes de passar para o próximo dedo. Afirmou que chegou ao ponto de se sentar sobre a mão para esconder das pessoas o dano causado. Ela parou de sair para jantar por se sentir muito constrangida.
A diabética, então, contou ao grupo como eles haviam melhorado sua vida quando inventaram um pequeno dispositivo de picada de dedo. Você o coloca na extremidade do dedo e aperta. O dispositivo coleta a quantidade mínima necessária de sangue, é quase indolor e deixa quase nenhuma marca. Ela contou como, por causa desse dispositivo, suas mãos se curaram e ela pode sair para jantar sem se sentir envergonhada. Ela relatou ao grupo: “Você mudaram a minha vida”.
A líder da Roche contou-nos que a equipe de dispositivo médico ficou realmente tocada pelo testemunho desta paciente. Ela disse que todos ficaram muito emocionados durante o encontro. E, durantes meses, as pessoas tiveram mais sentido de propósito.
Não importa o setor em que você atua. Se as pessoas conseguirem ver a causa e o efeito entre suas ideias e o progresso da sua equipe, ou entenderem o impacto de um cliente recebendo seu produto pontualmente, ou experimentarem como sua função é necessária para outras pessoas, elas obterão sentido de propósito.
Faça de forma autêntica
Contudo, há um problema. Você precisa acreditar naquilo que está dizendo e fazendo. Isso faz toda a diferença. Se suas tentativas de criar um propósito não se alinharem com seus outros comportamentos de liderança, os funcionários verão suas táticas como manipuladoras e não inspiradoras.
Logo depois que a mulher da Roche compartilhou sua história inspiradora, por exemplo, um homem levantou a mão do outro lado da sala e disse: “sim, eles tentaram essa besteira conosco também”.
“Eu tenho um chefe que nunca conversou sobre nada além de lucros trimestrais e atingir metas de remessa”, exclamou ele. “Bem, ele deve ter ido à London Business School e ouvido você falar sobre este estudo, porque um dia ele arrasta uma paciente para a nossa reunião semanal e faz com que ela nos conte essa história de como os medicamentos salvaram sua vida. Ou seja, tentando explorar nossas emoções para nos fazer trabalhar com mais afinco? Usando uma paciente para nos manipular!? Isso foi muito baixo”.
Podemos aprender muito com essa troca.
Se você é um líder e está tentando vender a ideia de propósito para as pessoas, mas não agiu de maneira consistente com esse propósito no passado, sua mensagem será um tiro pela culatra. Os humanos são máquina de detecção de autenticidade: somos atraídos pela sinceridade e repudiamos mentiras e falsidade.
Então, vá com calma. Se você fica pessoalmente inspirado por ouvir os clientes e realmente acredita no que está dizendo, vá em frente. Caso contrário, você pode apenas estar criando mais sentimentos de manipulação e não, inspiração.
Faça de forma duradoura
Mesmo que você faça do propósito algo pessoal e autêntico, você não pode fazer isso apenas uma vez. Ao contrário, faça disso uma rotina.
A Dra. Dorothee Ritz, Gerente Geral da Microsoft na Áustria, incentiva seus funcionários a sair em campo e experimentar os problemas dos clientes em primeira mão. Uma pequena equipe passou uma semana na rua com policiais, tentando entender quando e onde os dados remotos poderiam ajudá-los. Outra equipe passou dois dias em um hospital para observar e entender o que realmente significaria funcionar sem papel.
Ritz afirmou que essas experiências de imersão foram esclarecedoras para as pessoas. Ela disse que todos voltaram iluminados, e ficou claro para ela que as experiências pessoais dos funcionários aumentaram seu sentido de propósito, uma vez que testemunharam a razão de seu trabalho. Ritz observou os funcionários mergulharem em seus projetos com mais energia e entusiasmo depois de terem testemunhado as necessidades dos clientes.
Então, após um ano de experimentação com esta iniciativa, Ritz colocou em ação algo mais seguro. Ela selecionou um grupo importante de clientes (a quem chama de parceiros) de vários setores, variando desde fabricantes de carros a varejistas e hospitais. E, em seguida, 15 pessoas da Microsoft – uma equipe composta desde líderes seniores a associados – vão ao local, a cada empresa, e perguntam a várias pessoas de diferentes níveis: “Quais são suas dificuldades?” A equipe falou com pessoal de TI, é claro, mas também conversou com tomadores de decisão em diferentes funções.
Na Tesla, por exemplo, a Dra. Ritz contou-me como os funcionários da Microsoft em diferentes níveis praticaram uma conversa que começou com as necessidades da Tesla, em vez dos produtos da Microsoft. Eles se concentraram nos “furos” do processo que a Tesla precisava abordar. Em um importante varejista, um funcionário da Microsoft muito familiarizado com o Xbox fez algumas perguntas bem fundamentadas sobre problemas com o console. Isso levou a uma discussão prática e útil, em vez da narrativa de executivos de alto nível, o que ajudou a encaminhar toda a conversa para soluções práticas sobre as quais a equipe poderia voltar e trabalhar. Essas equipes da Microsoft voltaram com alguns novos contatos. No entanto, Ritz afirmou que o mais importante é que essas equipes entenderam o propósito dos projetos com base em testemunhar a situação e ouvir os problemas das empresas em primeira mão.
Ritz investiu profundamente em experiências de clientes que permitiram que os funcionários testemunhassem o impacto de seus trabalhos em primeira mão, o que os ajudou a criar conexões emocionais com o cliente e o trabalho, ajudando a Microsoft a explorar e aprender como organização.
O propósito pode ser uma ferramenta poderosa para líderes que desejam inspirar as pessoas para que tragam o seu melhor para o trabalho. Entretanto, a maioria dos líderes concorda que os funcionários não “entendem” o propósito de suas organizações. Isto porque propósito é algo pessoal e emocional. Muitas vezes, é mal gerenciado pelos líderes transacionais que fazem discursos sobre objetivos sociais elevados, em vez de ajudar a colocar os funcionários em contato direto com as pessoas a quem servem. O propósito pode fazer maravilhas com relação às contribuições dos funcionários quando os líderes começam com uma abordagem pessoal, autêntica e contínua.
Adaptado da obra Alive at Work: The Neuroscience of Helping Your People Love What They Do por Dan Cable.
Dan Cable é professor de comportamento organizacional na London Business School. Seu novo livro é intitulado Alive at Work: The Neuroscience of Helping Your People Love What They Do.
Fonte: HBR