Sempre ouvimos dizer que, para lidar com mudanças repentinas e drásticas, as empresas precisam ter agilidade e resiliência. Essa ideia nunca foi tão verdadeira quanto no momento atual, em que tentamos reagir às mudanças impostas pela pandemia de coronavírus. No entanto, estamos trabalhando em uma nova pesquisa que sugere que, para atingir agilidade e resiliência verdadeiras, as empresas precisam se comprometer com a estabilidade.
Uma base de estabilidade empresarial é o que garante confiança, segurança e otimismo em períodos de mudanças desordenadas no ambiente de trabalho, e permite que as pessoas mantenham a serenidade para conseguir agir de forma racional e se adaptar efetivamente à nova realidade na medida em que ela se apresenta. Diante desse cenário, elaboramos sete práticas embasadas em estudos que os líderes podem utilizar para desenvolver uma base de estabilidade durante a crise atual.
Ajustar o foco
Em meio a mudanças tão significativas, as pessoas perdem o foco, preocupadas com o que está acontecendo e com o que pode acontecer em seguida. Rupturas extremas e desafiadoras como as que estamos vivendo neste momento podem resultar em comportamentos contraproducentes e decisões ruins que vão desde subestimar a ameaça até sucumbir ao pânico – como acontece, por exemplo, quando há uma corrida frenética aos supermercados, o que acaba por causar desabastecimento.
Para incentivar respostas mais eficientes, os líderes precisam estabelecer prioridades. A prioridade máxima neste momento, sem dúvida, é fazer com que as pessoas se concentrem no que de fato importa: saúde e segurança. E isso significa que os líderes precisam fazer tudo o que estiver ao seu alcance para possibilitar, reforçar e, talvez, ampliar medidas de isolamento social para conter o avanço da pandemia. Feito isso, a prioridade seguinte é estabelecer quais são as tarefas e funções essenciais para a manutenção das atividades da empresa.
É preciso que os líderes ajam com disciplina para identificar as prioridades máximas e comunicá-las às equipes, repetindo-as à exaustão. Como grande parte dos funcionários no mundo todo estão trabalhando remotamente, é grande a probabilidade para distrações e falhas na comunicação. Portanto, deixe muito claro quais são as prioridades e faça todo o possível para ajudar os funcionários a se concentrar nelas.
Não é hora de continuar insistindo em iniciativas “desejáveis” ou transformações que envolvam todo um sistema. Deixe essas ações de lado enquanto a empresa estiver operando em modo de sobrevivência, e reavalie suas prioridades. Algumas fabricantes de medicamentos adotaram essa estratégia, por exemplo, ao suspender o trabalho em projetos que já estavam em andamento, para concentrar esforços no desenvolvimento de vacinas e antivirais relacionados à pandemia.
Derrubar barreiras
Os líderes precisam estar atentos a barreiras de performance que possam ameaçar a estabilidade e abalar a confiança. Estamos percebendo rapidamente que os sistemas e ferramentas de teletrabalho nem sempre podem fazer frente ao súbito aumento da demanda pelo trabalho à distância.
As empresas devem fornecer o suporte necessário. Para ajudar a facilitar encontros e conexões entre os funcionários, elas podem oferecer múltiplas formas de videoconferência, adotando alguns aplicativos alternativos para substituir sistemas principais em caso de falhas. Em atenção a funcionários com filhos, que estão dividindo o dia de trabalho com o cuidado com as crianças, alguns gestores estão planejando reuniões para após o horário do expediente, ou disponibilizando gravações de vídeos em baixa-resolução que possam ser vistos em momentos alternativos.
Como líder, é preciso estar em sintonia com a equipe diante do surgimento de novos processos e ferramentas. Isso vai ajudá-lo a identificar com rapidez as forças desestabilizadoras, eliminá-las pela raiz e apresentar soluções criativas. Anteveja barreiras, planeje soluções alternativas e, sempre que necessário, coloque-as em prática com agilidade para evitar rupturas no futuro.
Otimizar as falhas
Os líderes geram segurança psicológica entre equipes e funcionários quando se mostram abertos às suas ideias e experimentam suas sugestões. Isso também pode ser feito ao se aproveitar as falhas como oportunidades de aprendizado para todos, e, em vez de apontar culpados, investir em colher lições sobre o que funcionou ou não. Uma ideia é dedicar um tempo das reuniões semanais de atualização para falar disso.
Uma forma de inspirar estabilidade é conduzir rápidas análises posteriores com funcionários individualmente ou equipes inteiras. É necessário garantir que essas conversas sejam seguras e tragam à discussão o que os integrantes da equipe estão aprendendo, apontando as melhores práticas no trabalho rumo a novas formas de interação e identificando as experiências que não se mostraram eficientes. Documentar essas lições também pode ser útil no momento pós-pandemia, trazendo novos modelos de organização e coordenação do trabalho.
Um trabalho exemplar está sendo realizado nesse campo pelas empresas Ford, 3M e GE Healthcare, que se uniram para produzir com rapidez equipamentos que vão de máscaras a respiradores. As empresas estão se adaptando e improvisando com designs de produção simplificados e novas cadeias de suprimentos de peças e componentes. É uma iniciativa ousada e criativa, que requer a otimização das falhas, em que a equipe tenta solucionar uma série de problemas imprevistos, sejam eles pequenos ou grandes.
Desenvolver o otimismo
Como disse Napoleão, o líder é um “negociador de esperança”. Em meio a uma crise, os líderes precisam inspirar confiança, força e positividade. Essas são qualidades estabilizadoras, assim como o otimismo. O velho clichê é verdade: líderes perspicazes sabem que todo problema representa uma oportunidade. Ao se concentrar nessas oportunidades e capacitar as equipes para capitalizá-las, serão capazes de criar um otimismo estabilizador.
Nada disso, porém, significa negar a realidade ou manipular notícias ruins, o que só serve para cultivar o descrédito e a desconfiança. Os líderes precisam reconhecer diretamente os reveses e decepções, e se concentrar – de forma otimista, porém pragmática – no que pode ser feito para avançar.
Tranquilizar as pessoas
Crises e mudanças radicais geram ansiedade. Portanto, faça todo o possível para tranquilizar a mente das pessoas, reafirmando os papéis, valores e futuro de cada uma delas. Como já foi mencionado acima, é fundamental manter o equilíbrio entre ser realista e otimista. Não faça promessas exageradas, pois elas poderão minar a confiança, que é a base da estabilidade. Na força-tarefa da Casa Branca contra o coronavírus, o Dr. Anthony Fauci descreveu a si mesmo como a autoridade mais confiável e de maior credibilidade, e suas aparições tranquilizadoras na mídia servem de exemplo a outros líderes.
Concentre-se em compartilhar o máximo de informações concretas e positivas, sejam elas sobre a saúde financeira da empresa, estratégias específicas para sobreviver à desaceleração econômica, ou planos para a proteção de empregos. Mensagens desse tipo têm fortes efeitos estabilizadores, pois eliminam dúvidas e afastam temores. Da mesma forma, explicar racionalmente os motivos para cortes de forma direta e transparente ajuda a fazer entender e aceitar melhor sua necessidade. Notícias difíceis dadas corretamente são mais estabilizadoras do que uma comunicação incorreta ou inexistente, que costumam levar as pessoas a esperar pelo pior.
Além disso, em épocas de mudanças drásticas, é mais importante do que nunca que os líderes dediquem algum tempo para se aproximar do seu pessoal. Pode ser por meio de simples chamadas telefônicas (“Tirei uns instantes para saber como você está”), e ouvir com atenção suas preocupações e incertezas. Uma ótima regra de ouro: É melhor “aproximar-se” antes de “verificar”. Ou seja, primeiro, pergunte como a pessoa e a família dela estão. Mostre que você se importa. Só depois pergunte como anda o trabalho e se há algo que você possa fazer para ajudar.
Como líder, você não precisa solucionar cada problema prático ou emocional para ajudar. Apenas ouvir com empatia já faz a diferença. É possível exercer uma influência estabilizadora doando parte do seu tempo, oferecendo suporte emocional e manifestando interesse.
Harmonizar recursos
“Fazer mais com menos” é uma afirmação que costuma acabar com a moral da equipe. Em tempos de crise, pode ser ainda pior, sugando o tempo, a energia e a atenção das pessoas. Uma equipe exaurida, sem concentração e com poucos recursos apenas acrescenta maior instabilidade a uma situação já complicada. Portanto, concentre seus esforços para equilibrar a equação entre a demanda de trabalho e a disponibilidade de recursos.
Pense no que tem sido feito para ajudar a aliviar a enorme pressão sobre os profissionais de saúde, que tentam fazer seu trabalho durante a crise sem as ferramentas, o espaço e os equipamentos de proteção individual necessários. No lado da demanda, estão sendo implementadas diretrizes para a priorização e a triagem no atendimento aos pacientes; no lado dos suprimentos, os recursos estão sendo potencializados por meio da reciclagem de equipamentos, construção de capacidade adicional em estacionamentos e expansão da cadeia de abastecimento.
Uma resposta comum à pressão econômica é, obviamente, apertar os cintos. As empresas decidem reduzir despesas, suspender contratações, aumentos e promoções e, até, demitir. Antes de tomar medidas drásticas como essas, tente parar e pensar no efeitos que elas terão sobre funcionários e parceiros. Será que causarão estabilidade ou instabilidade? Pode até ser necessário cortar custos, mas líderes sábios pensam no impacto gerado nos seus já estressados funcionários, que precisam se manter fortes e saudáveis, e se esforçam para encontrar alternativas criativas que possam reduzir demandas e aumentar recursos.
Se decidir que precisará tomar uma medida desestabilizadora – como demitir funcionários – pense com muito cuidado em como comunicar essa notícia. O que é necessário para proteger a empresa, e como os líderes podem minimizar um impacto desestabilizador dessas ações sobre as pessoas? Uma empresa para a qual prestamos consultoria planejava resolver os problemas mais fáceis em um determinado departamento, mas depois parou para pensar nas ramificações dessa medida, e acabou percebendo que poderia distribuir as economias de custos de forma mais abrangente por toda a empresa e aliviar a carga.
Faça um plano de recuperação
Para garantir estabilidade enquanto trabalha para a nova normalidade, seja o que ela signifique, desenvolva um plano de recuperação. Ele não precisa ser perfeito, até porque ninguém tem bola de cristal. Apenas faça o possível para que os funcionários saibam quais serão os primeiros passos na recuperação da empresa. Até o plano de recuperação mais rudimentar dará aos funcionários algum foco de atenção, além de fazer com que o seu próprio trabalho pareça menos assustador quando, enfim, tudo passar. Demonstrar a evolução à medida que o plano se desenrola pode ter efeitos estabilizadores psicologicamente importantes.
Faça também planos de contingências. Por exemplo, para garantir continuidade do trabalho caso alguns funcionários adoeçam durante a crise, muitos gestores estão apontando substitutos para funções essenciais e fornecendo treinamento múltiplo para que estes possam assumir papéis diferentes. Planos desse tipo reforçam a confiança de que as equipes são capazes de absorver solavancos. Ainda que esses cenários não se confirmem por completo, o ato de planejar para situações de emergência promove estabilidade, fornecendo às equipes um modelo de como se adaptar e também desenvolve confiança na capacidade de lidar com o inesperado, ajuda os funcionários a trabalhar com serenidade e retornar às operações mais rapidamente.
Elaine Pulakos é CEO da PDRI e especialista no desenvolvimento de competências que representem crescimento para o negócio. Pulakos é conhecida pelo trabalho de pesquisa e escrita de textos sobre agilidade e resiliência, além de ter ampla experiência global em ajudar empresas a desenvolver essas competências para aumentar sua vantagem competitiva e performance.
Robert B. (Rob) Kaiser é presidente da Kaiser Leadership Solutions e consultor, autor e especialista em liderança. Kaiser em ampla experiência global em desenvolvimento executivo, avaliação executiva e análise de dados na gestão de pessoas, além de prestar consultoria estratégica na gestão de talentos para CEOs e gestores de RH.
Fonte HBR